O risco mortal de uma gargalhada
Quem nunca ouviu o ditado “muito riso, pouco siso”? Este provérbio sugere que quem ri demais é alguém que não leva a vida à sério, refletindo uma visão conservadora e disciplinada do comportamento humano. O riso é muito vezes desencorajado, especialmente em ambientes mais formais, como o profissional. Porém essa visão tem sido cada vez mais considerada antiquada, pois hoje se reconhece o valor do riso e da leveza como elementos essenciais para o equilíbrio e bem-estar emocional.
Historicamente os homens foram educados a serem racionais, controlados e emocionalmente reservados, enquanto as mulheres eram tidas como mais emocionais e sensíveis. Embora mostras da vulnerabilidade feminina fossem por vezes consideradas charmosas e exóticas, qualquer expressão emocional mais intensa era malvista. As normas sociais vigentes diziam que, para uma mulher ser considerada virtuosa, ela deveria parecer modesta, tímida e controlada.
A moda do uso de espartilhos na Inglaterra vitoriana estava em sintonia com as normas comportamentais e estéticas vigentes àquela época. Este acessório para modelagem do corpo era feito com uma estrutura de tecido rígido reforçada por barbatanas de aço ou ossos de baleia. Isto resultava em uma limitação da capacidade respiratória das mulheres devido à compressão dos órgãos internos. Situações como acessos de riso e espirros podiam resultar em profundo desconforto, podendo frequentemente resultar em desmaios, pois exigiam um maior espaço para a expansão dos pulmões do que aquele proporcionado pelos espartilhos. Vem desta época a crença em que as mulheres eram criaturas muito sensíveis que deveriam controlar suas emoções, senão poderiam desmaiar ou coisa pior.
Foi na época vitoriana que se criou a expressão “morrer de rir”. Que outra cultura seria capaz de sugerir que o riso pode ser perigoso? Se procurarmos na história, poucas foram as vezes em que alguém morreu de tanto rir. E curiosamente todas estas pessoas foram homens.
Conta-se que Chrysippus, filósofo da Grécia antiga adepto do estoicismo, foi uma dessas pessoas. A escola estoica enfatiza a importância da razão, da virtude e do autocontrole como caminhos para alcançar uma vida plena e tranquila. Contudo, há relatos de que justamente ele teria perdido seu autocontrole ao embebedar seu burrinho de estimação com vinho e então solicitar aos seus escravos que trouxessem um prato de figos para que o animal pudesse ter uma refeição completa. Chrysippus teria achado essa cena tão engraçada, que se finou de rir!
Outra vítima fatal de uma crise de riso foi o intelectual escocês Thomas Urquhart. Ao saber que Carlos II tinha sido eleito o novo rei da Inglaterra, Thomas teria tido uma crise incontrolável de riso que lhe custou sua vida.
Aproveitando essas histórias que vagavam pelo imaginário popular e os desmaios frequentes das damas de sociedade, a Lloyd’s of London criou no final do séc. XIX um seguro contra o risco de morrer de rir em espetáculos de comédia. Este seguro teria sido oferecido nos shows do famoso humorista inglês Dan Leno, que era conhecido pelas suas apresentações hilariantes. A ideia de criar este tipo de seguro foi uma jogada de marketing que despertou muita curiosidade no público, tornando-se um exemplo de publicidade criativa
Lembra do Chrysippus de quem te falei logo acima? Se ele soubesse que de sua imensa obra sobraram apenas uns poucos fragmentos para contar a sua história, com certeza ele teria perdido todo o seu bom humor e tido uma vida mais longa.
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