Viajar é preciso. Se preparar também é preciso.
Quem viaja por impulso, sem planejar cuidadosamente a sua viajem e estudar a história e os costumes do país de destino está fadado a desiludir-se. Mas ser surpreeendido de vez em quando também bom, não é?
Naquele ano, um colega de trabalho me comunicou que dali a uns meses ele viajaria para a China com sua irmã, uma seguidora do profeta Waldo Vieira. A excursão organizada pela sua seita fazia parte de uma iniciativa para levantar fundos para a publicação da ‘Enciclopédia de Conscienciologia’.
Durante um mês inteiro, a cada pausa para café, fui informada sobre mais e mais detalhes da programação de uma viagem que prometia ser, no mínimo, exótica. Ao final daquele período, comuniquei ao meu colega que pretendia me juntar ao grupo. Em cada uma das noites que antecederam nossa partida, vi desfilarem na tela de minhas pálpebras adormecidas imagens de pagodes coloridos, Budas folheados a ouro e pratos fumegantes de pato laqueado.
Quando afinal cheguei ao hotel em Beijing, corri imediatamente para a janela de meu quarto no 24º andar e abri as cortinas para usufruir da vista tão sonhada. Contudo a ilusão de conhecer uma China repleta de vestígios de antigas dinastias se evaporou como em um passe de mágica: a visão que se descortinava à minha frente estava mais para um filme dos Jetsons.
A poucos metros da minha janela, um operário cujo único equipamento de segurança era um capacete, caminhava tranquilamente sobre o topo de um prédio em construção do qual se projetavam varas de bambu em direção ao céu. Com o coração aos saltos, tentei imaginar como ele faria quando o vento começasse a soprar e ele fosse jogado aos ares. Seria ele capaz de impulsionar o corpo de uma haste de bambu para a outra como fazem os mestres de artes marciais no filme ‘O Tigre e o Dragão’?
Embora os protocolos de segurança da construção civil fossem arcaicos, uma febre da modernidade havia definitivamente atingido a China. Em meio a um mar de espigões dos anos 2000, restavam três ou quatro casas de madeira dos tempos da Revolução Comunista onde os moradores viviam uma rotina puramente turística. Os prédios construídos nas décadas de 1970 e 1980 também tinham sido considerados velharias impróprias para moradia, assim como as velhas casas, e vinham sendo demolidos diligentemente. Para visitar os budas folheados a ouro e os belos pagodes precisamos percorrer horas de estrada. O empenho em remover os vestígios do passado e construir a China do futuro era tão grande que, ao viajar pelas estradas do interior, atravessamos cidades fantasmas recém-construídas que aguardavam pacientemente o dia em que o povo se interessaria por habitá-las.
Eu havia viajado em busca de memórias exóticas de uma China há longo tempo desaparecida, mas o que me aguardava eram os alicerces do futuro do nosso planeta. Quantas outras vezes eu ainda seria surpreendida antes de finalmente aprender a estudar com afinco sobre o destino de minhas viagens?
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