A vida incomum de Dorothy Eady: sacerdotisa ou louca?
Há histórias fantásticas, caro leitor, que chegam aos nossos ouvidos quase que por encanto. A história de Dorothy Eady é um destes casos. Durante um almoço de domingo, falávamos sobre histórias de assombração na família, quando minha tia se lembrou de uma mulher que afirmava ter vivido no Egito antigo e que teria decifrado vários hieróglifos para os arqueólogos que trabalhavam no Vale do Nilo. Ao perguntar ao ChatGPT quem seria esta mulher, ele me respondeu: “A mulher a que você se refere é provavelmente Dorothy Eady, famosa por sua crença de que era a reencarnação de uma antiga sacerdotisa egípcia”. Isto bastou para que eu dedicasse algumas horas a ler e ouvir vídeos sobre esta mulher. Mas o que eu vim a descobrir após alguma pesquisa na internet é realmente coisa do outro mundo. Especialmente o fim desta história.
Dorothy nasceu em Londres em 1904, no seio de uma família de classe média baixa. Seu pai era um alfaiate que se tornou conhecido pelos seus figurinos para os filmes do cinema mudo, que o permitiram comprar um Pontiac negro. Como carro era coisa rara na Londres daquela época, o Pontiac lustroso conferiu à família da pequena Dottie uma certa notoriedade. Afora isto, não havia nada de incomum com sua família.
Mas isso mudou no dia em que Dorothy, aos 3 anos de idade, levou um tombo na escada de sua casa. A coisa foi tão séria que o médico declarou que ela estava morta, e que voltaria dali a pouco com o certificado de óbito da garota e uma enfermeira para preparar o corpo. Porém, ao retornar uma hora mais tarde, ela estava sentada na cama, brincando de boneca como se nada tivesse acontecido.
A partir dali Dottie começou a ter crises de humor, em que se escondia sob a mesa da sala de jantar e, aos berros, pedia que a levassem de volta para o “seu lar”. Não havia Cristo que a convencesse de que seu lar era ali onde ela havia vivido até então. Na tentativa de distrair a garota, seus pais decidiram levá-la ao Museu Britânico. Contudo, Dottie permaneceu desinteressada e de cabeça baixa quase todo o tempo em que caminhou pelos longos corredores do museu com seus pais. Mas tudo mudou no instante em que ela pisou na seção do Egito Antigo. Extasiada, ela começou a exclamar que finalmente estava “entre seu povo”, se pondo a beijar os pés das estátuas, e a encarar longamente as múmias em seus sarcófagos.
A partir deste dia, ela passou a sonhar repetidamente com o Templo de Seti I, em Abydos, 350 milhas ao sul de Cairo. Mas ela apenas soube onde se passava o seu sonho no dia em que, folheando uma revista, se deparou com uma reportagem sobre este templo no Egito. As fotos do templo eram idênticas à casa de seus sonhos! “Este é o meu lar”, ela afirmou, mostrando a revista aberta à sua mãe. “Mas onde estão os jardins?”
Por causa desses sonhos e de sua obsessão com o Egito, ela foi expulsa repetidas vezes das escolas em que estudou. Foi acusada de perturbar as demais crianças com histórias sobre sua vida passada, de fazer comparações em aula entre a religião cristã e o paganismo egípcio, e de se negar a cantar um hino religioso que suplicava à Deus que amaldiçoasse os egípcios. Aos poucos, ela foi desistindo de ir à escola. Preferia passar horas a fio admirando a exposição sobre o Egito Antigo no Museu Britânico.
Tamanho entusiasmo em uma garotinha de apenas 10 anos acabou chamando a atenção do curador da exposição. Arqueólogo e filologista de 57 anos, era ele que havia coletado a maior parte das peças exibidas no Museu e, em breve, seria condecorado cavaleiro pela Rainha por isso. Este decidiu ensiná-la a ler hieroglifos. e surpreendeu-se ao descobrir que aquilo que os eruditos levavam anos para aprender, ela aprendia em poucos meses. Porém, apesar de ser uma garota prodígio, ela nunca mais voltaria a por os pés em uma escola.
Aos 15 anos de idade, ela começou a relatar aos seus pais histórias perturbadoras sobre visitas noturnas do Faraó Seti I. Visitas estas tão íntimas que, ao acordar, ela ainda sentia um peso em seu peito. Além disto, ela sofria com crises severas de sonambulismo e de pesadelos. Tudo isso levou seus pais a decidirem interná-la repetidas vezes para observação em uma instituição para doentes mentais.
Aos 27 anos, ela se mudou para Londres e lá conheceu um rapaz egípcio com quem continuou a se corresponder após o retorno dele ao seu país de origem. Dois anos mais tarde, eles decidiriam se casar e ela embarcaria em um navio para encontrar seu noivo no Egito. Uma mulher miúda e desprotegida abandonando sua família e atravessando sozinha o oceano para iniciar uma nova vida em um país de cultura absolutamente diferente da sua... Dorothy definitivamente não era uma mulher convencional do seu tempo!
Imam Abdel Meguid era um rapaz da classe abastada que lhe proporcionou uma vida de luxo, à qual não estava acostumada. Logo eles se tornariam pais de um garotinho, que foi batizado de Sety a seu pedido. Mas a família de Imam não estava satisfeita com as excentricidades de sua nova nora...
Logo após o nascimento do filho, ela voltou a ter pesadelos noturnos e, ao acordar-se, escrevia páginas e mais páginas de hieroglifos que registravam tudo o que ocorria em seus sonhos. Ela dizia que noite após noite recebia a visita de uma entidade chamada Hor-Ra, que vinha narrar a história de sua encarnação no Antigo Egito. Uma história que havia se passado por volta do ano 1300 AC, durante o reino do faraó Seti I.
As 70 páginas de hieroglifos contavam a vida de uma menina que havia nascido em uma família modesta, filha de um guerreiro da armada do faraó e de uma vendedora de legumes. Sua mãe morreu quando ela ainda era muito pequena. Seu pai, sentindo-se incapaz de criar a filha sozinho, decidiu entregá-la ao templo, onde ela acabou se tornando uma virgem consagrada à Deusa Isis. Bentreshyt, esse era seu nome, era uma jovem muito bonita por quem o faraó seu apaixonou ao vê-la caminhando pelos jardins do templo. Os longos passeios do casal de amantes por esses jardins resultaram em uma gravidez. Porém, quando a barriga de Bentreshyt começou a se tornar proeminente, ela foi ameaçada pelo sacerdote do templo: se não dissesse o nome do pai da criança, ela seria executada. Decidiu então tirar a própria vida e assim proteger o seu amante das consequências desta relação proibida.
O sono agitado de Dorothy e os repetidos relatos sobre seu amante do Egito Antigo levaram o marido e a família dele ao desespero. Apenas dois anos após o casamento, eles decidiriam se separar. Imam foi então trabalhar como professor no Iraque e ela decidiu mudar-se com seu filho para um vilarejo próximo às pirâmides de Gizé. Aos 31 anos de idade, Dorothy estava prestes a empregar todos os recursos necessários para atingir o objetivo de sua vida: “ ir para Abydos, viver em Abydos e ser enterrada em Abydos”.
Esta história continua no próximo capítulo.
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